O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry
Um aviador encontra-se no Saara tentando consertar o seu avião para continuar seguindo viagem. Eis que surge um menino em pleno deserto e diz: "Desenhe um carneiro para mim". O aviador responde que não sabe desenhar, pois quando criança até tentara desenvolver esse ofício, mas os adultos disseram a ele para fazer outra coisa, pois não era bom naquilo. Ah, os adultos!
Mas, o menino insiste. Ele nunca desistira de algo que quisesse. O aviador, como que para se livrar do menino, uma vez que precisava urgentemente consertar seu avião, desenha o carneiro e, também, a pedido do menino, uma caixa para colocar o animalzinho dentro. São desenhos muito pequenos, porque o garoto já alertara que no seu planeta, pouco maior que uma casa, as coisas eram bastante pequeninas.
Assim, o aviador conhecera o Pequeno Príncipe e pôs-se, seis anos depois, a nos contar essa história.
O pequeno príncipe deixara seu pequeno planeta em busca de trabalho e para aprender coisas novas. No seu planeta, ele tinha por atividade limpar três vulcões, um deles inativo, bem como impedir que os baobás crescessem demasiadamente a ponto de ocupar todo o seu planeta, um dos motivos porque ele queria um carneiro que comesse os baobás.
Antes de chegar à Terra e conhecer o aviador, o pequeno Príncipe passara por alguns outros planetas e conheceu algumas figuras inusitadas.
O primeiro planeta era habitado por um rei. Ao ver o pequeno príncipe, o rei se animou com a ideia de ter um súdito aos seus pés, orgulhoso que era. O rei fez questão de afirmar ao pequeno todo o seu poder, já que reinava sobre todas as coisas. O que mais causava alegria ao pequeno era ver o pôr-do-sol, portanto pediu ao todo poderoso que usasse de seu poder para ordenar ao sol que se pusesse várias vezes num só dia. Infelizmente, o rei não pôde atender a esse pedido. Como não queria admitir que seu poder não era tão grande assim, informou ao menino que precisava esperar por condições mais favoráveis para atender o seu pedido.
Entretanto, o soberano ofereceu outras regalias ao pequeno. Poderia torná-lo Ministro da Justiça, embaixador ou qualquer outra autoridade. Mas, o pequeno só queria a chance de ver o sol se pôr várias vezes num só dia. Esse era o seu único desejo.
Ser Ministro da Justiça não o interessou. Julgar a quem? Não havia ninguém para julgar. Além do mais, ele não gostava de condenar ninguém à morte. Então, resolveu ir embora daquele lugar.
O Rei ponderou: "Você pode julgar a si mesmo." A resposta do pequeno foi categórica: "Posso julgar a mim mesmo em qualquer outro lugar." Depois, foi-se embora.
O segundo planeta era habitado por um vaidoso. Se alguém ainda não sabe, quero explicar. Vaidoso é aquele que tem vaidade. Vaidade provém do latim vanitas e quer dizer vazio. Somos vaidosos porque somos vazios. Dentro de nós sabemos o tamanho de nossa insignificância e, por isso, queremos provar o tempo todo que somos importantes. Eclesiastes, um dos livros bíblicos que mais gosto e que deu-me a dimensão da existência, nos chama a atenção para a nossa desimportância diante da magnitude de Deus:
"É para o benefício das pessoas que Deus as põe à prova, para que vejam que elas, em si mesmas, são como animais, pois a sorte do ser humano e dos animais é a mesma; tanto morre um como o outro; todos têm o mesmo sopro. O ser humano não leva vantagem nenhuma sobre os animais, porque tudo é ilusão. Todos vão para o mesmo lugar: Todos vêm do pó, e ao pó todos voltam."
Portanto, tudo é ilusão e vaidade.
Dito isso, saltemos para o encontro do pequeno príncipe com o nosso vaidoso, que gostava de muitos aplausos e elogios. "Os vaidosos só escutam os elogios."
Quis ser admirado pelo pequeno, que nem sabia o que era admirar. "Admirar significa reconhecer que eu sou o homem mais belo, o mais bem-vestido, o mais rico e o mais inteligente do planeta" - disse o vaidoso.
O pequeno príncipe achou tudo muito estranho e questionou: "Eu até posso admirá-lo. Mas o que você ganhará com isso?" E foi-se embora do segundo planeta.
O aplauso, o elogio, o reconhecimento ou o julgamento do outro não muda o que somos e também não altera quem somos. E por que sempre estamos buscando aceitação do outro? Porque somos vazios e iludidos. Porque nos vemos mais poderosos do que realmente somos e não pensamos que basta uma ventania, uma doença ou uma rejeição para nos derrubar. Grande é Deus. Ele e só Ele. O livro da Sabedoria, Eclesiástico, nos alerta a combater nosso complexo de Deus: "De que, porém, se orgulhará quem é terra e cinza, quem, ainda em vida, expele os intestinos: Uma doença prolongada zomba do médico; quem hoje é rei amanhã estará morto. Pois na morte são os répteis, as feras e os vermes que têm como herança o ser humano".
Quero que vocês, meus leitores, perdoem-me por estar sendo tão dura. O pequeno príncipe é um livro tão amado por muitos e eu me ponho a fazer considerações sobre finitude ou morte. Não me levem a mal. Para vivermos melhor, dando atenção ao que realmente importa na vida, precisamos o tempo todo estarmos conscientes da nossa mortalidade.
O exercício que faço contra a minha vaidade é diário e constante. E, ainda assim, muitas vezes suponho-me grande. Aí quando vou crescendo, crescendo e crescendo, leio Eclesiastes e Eclesiástico e, de novo, torno ao pó.
A existência do pequeno príncipe era simples e melancólica, desprovida de toda vaidade. Não sou eu que o digo para afirmar minha própria melancolia. O livro o diz. E, por isso, talvez eu ainda tenha que falar aqui de coisas simples e melancólicas. Perdoem-me mais uma vez. Apesar disso, o que quero é que vocês sejam alegres.
Já o terceiro planeta era habitado por um bêbado. Um bêbado que bebia para esquecer que bebia, pois sentia vergonha de beber. Pergunto-me: por que às vezes continuamos fazendo o que nos envergonha?
O quarto planeta era habitado por um empresário que mal percebera a presença do pequeno príncipe, uma vez que estava muito ocupado fazendo suas contas. O empresário se autointitulava como um homem preciso e sério, que não tinha tempo para lidar com bobagens, pois andava sempre muito ocupado. Tão ocupado com os seus negócios que até desenvolveu uma crise de reumatismo por não ter tempo de praticar atividade física. Só os números é que interessavam o empresário. Porque os adultos adoram números.
"Quando vocês falarem de um novo amigo, os adultos nunca vão perguntar sobre as coisas essenciais. Nunca irão perguntar, por exemplo: "Qual é o som da voz do seu amigo? Quais as brincadeiras que ele gosta mais? Ele coleciona borboletas?" Os adultos irão perguntar: "Qual a idade dele? Quantos irmãos ele tem? Quanto ele pesa? Quanto o pai dele ganha?" Só assim acreditam que podem conhecer uma pessoa. Se vocês disserem aos adultos: "Vi uma linda casa de tijolos cor-de-rosa, com gerânios nas janelas e pombos no telhado...", eles não conseguirão visualizar essa casa. Será preciso dizer: "Vi uma casa que custa dois milhões de reais." Aí, sim, eles vão exclamar: "Essa casa deve ser linda"!
Portanto, não permitam que suas ocupações diárias e a necessidade de acumular, a ganância, façam com que vocês percam a sensibilidade para o essencial. Esqueçam os números.
Ao perceber a forma estranha com que o empresário conduzia sua vida, o pequeno príncipe resolvera ir embora daquele planeta.
O quinto planeta, de tão pequeno que era, só cabia um lampião e um acendedor de lampião. O acendedor acendia e apagava o lampião minuto por minuto. Esse ofício chamou a atenção do pequeno príncipe, que logo quis saber o porquê do acender e apagar o objeto em períodos tão curtos de tempo. O acendedor de lampiões respondeu que era o que mandava o regulamento. Entretanto, o planeta começou a girar mais rápido e o regulamento não fora atualizado. Ainda assim, o acendedor era fiel à sua função de acender e apagar o lampião, conforme a regra.
O pequeno príncipe imaginou que o habitante do quinto planeta talvez fosse desprezado pelo rei, pelo vaidoso, pelo bêbado e pelo empresário, contudo reconheceu: "ele é o único adulto que não me parece ridículo, talvez porque se dedica a fazer uma coisa sem se preocupar apenas com os seus próprios interesses". "Este é o único adulto que poderia ser meu amigo."
O sexto planeta era ocupado por um geógrafo que se autointitulava muito importante (ele era muito vaidoso). O geógrafo ficava em seu planeta esperando que os exploradores chegassem com as informações sobre cidades, mares, montanhas, rios, desertos e oceanos para que ele fizesse suas anotações.
O pequeno príncipe pôs-se a falar sobre o que existia em seu próprio planeta. Ao informar ao geógrafo que em seu planeta existia uma flor, aquele não achou nada interessante essa informação para os livros de geografia. "As flores são efêmeras", disse ao pequeno. "Mas o que significa efêmera?" - indagou. O geógrafo respondeu que efêmera é uma coisa ameaçada de desaparecer em breve.
Ao lembrar da flor que deixara e de sua efemeridade, o pequeno príncipe teve a sua primeira reação de arrependimento. Descobriu ali a mortalidade do ser amado. Talvez não houvesse mais tempo de recuperá-la. Talvez, quando voltar para o seu pequeno planeta, a flor terá desaparecido, pensou ele. Isso o entristecera e ele foi embora do sexto planeta pensando em sua flor.
De novo, o tema da finitude nos lembrando de que não somente as flores são mortais como também o são todos aqueles que amamos.
O pequeno príncipe amava a flor, mas a achava extremamente vaidosa e orgulhosa e esse fato passou a incomodá-lo muito.
Por outro lado, era uma flor bela, envolvente e perfumada. Tinha defeitos e qualidades como qualquer ser.
Ainda assim, o pequeno príncipe resolveu abandoná-la, mesmo depois de a flor declarar o seu amor por ele e admitir o quanto fora vaidosamente tola.
"Fui incapaz de entendê-la! Eu não deveria ter julgado a flor por suas palavras, mas por suas ações. Ela me oferecia seu perfume e me enchia de alegria. Eu jamais deveria tê-la abandonado! O certo mesmo era eu ter percebido sua ternura por trás daqueles truques bobos. As flores são tão contraditórias. Mas eu era jovem demais para saber amá-la."
Precisamos entender e, sobretudo, aceitar que os que amamos, assim como nós mesmos, têm virtudes e defeitos. Essa é uma verdade imutável, ainda que não saibamos lidar com ela. Somos imperfeitos, mas podemos nos tornar melhores a cada dia sem que para isso abandonemos os que amamos. Não deixemos o arrependimento vir tarde como veio para o pequeno príncipe ao lembrar da possibilidade de ter perdido a sua flor. Aprendamos com a dor dele antes que tenhamos as nossas próprias dores por não aprendermos com os exemplos dos outros.
O sétimo planeta visitado pelo nosso pequeno príncipe foi a Terra.
"A Terra não é um planeta como outro qualquer. Existem nele cento e onze reis (não se devendo esquecer, é óbvio, os reis negros), sete mil geógrafos, novecentos mil empresários, sete milhões e meio de bêbados, trezentos e onze milhões de vaidosos, ou seja, um total de mais ou menos dois bilhões de adultos."
Ao chegar à Terra, o pequeno príncipe se deparou com um jardim cheio de rosas. Eram rosas muito parecidas com a flor que deixara. O pequeno ficou profundamente triste porque sua flor tinha lhe falado que era a única de sua espécie em todo o Universo. "E agora estavam na sua frente cinco mil flores muito parecidas com ela, num único jardim!"
Mais tarde, ao se deparar com uma raposa, as coisas começaram a ficar mais claras para o pequeno.
A raposa, muito astuta, explicou-lhe: "Você, para mim, ainda não passa de um menino semelhante a milhares de outros meninos. Eu não tenho necessidade de você. E você também não tem necessidade de mim. Eu, para você, ainda não passo de uma raposa semelhante a milhares de outras raposas. Mas se você me cativar, nós teremos necessidade um do outro. Você será o único menino do mundo para mim. E eu serei a única raposa do mundo..."
Assim, o pequeno príncipe entendeu que sua flor não era uma flor como as outras. Ela o havia cativado. É o tempo que doamos ou perdemos com algo ou alguém que torna esse algo ou alguém importante para nós.
Portanto, "somos sempre responsáveis por aquilo que cativamos". Somos nós os próprios responsáveis pelos laços que criamos.
O pequeno príncipe também achou o sétimo planeta muito estranho e fez algumas observações acerca dos habitantes da Terra:
"Os seres humanos não têm imaginação. Só repetem o que os outros dizem..."
"Ninguém está contente no lugar onde está."
"Só as crianças sabem o que procuram."
"Os seres humanos embarcam num trem expresso, mas depois já não sabem o que estão procurando. E por isso começam a se agitar e dão mil voltas sem saber para onde ir..."
Esse é um livro para ser lido e relido inúmeras vezes, em diversos momentos de nossa vida. Eu mesma já o li três vezes e cada vez aprendo algo novo. Não é à toa que se tornou um clássico da literatura. O seu autor, Antoine de Saint-Exupéry, era mesmo um aviador que teve seu avião abatido pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
Ao saber de quem se tratava, o soldado que alvejou o avião do escritor, declarou: "Eu só soube depois que era Saint-Exupéry. Eu queria que não tivesse sido ele, porque todos os jovens da minha geração leram seus livros. Nós adorávamos ele."
Talvez o pequeno príncipe tenha retornado ao seu planeta e encontrado sua flor. Não saberemos.
Não saberemos se a serpente que prometera levá-lo de volta ao seu planeta cumpriu a promessa ou se usou de artimanhas para destruí-lo.
Prefiro acreditar que ele teve um final feliz ao lado de sua flor e que aprendeu que não adianta andar por todos os planetas se não temos ao nosso lado os que amamos.
O essencial não é ver paisagens, não é transitar por todos os lados, não é conhecer pessoas "importantes", não é dar voltas e voltas ao mundo, pois "só se ver bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos".
Como nos ensina a Bíblia, em Mateus: "Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração."
Descubram, leitores, onde estão os vossos tesouros e não percam tempo de suas vidas dando voltas e mais voltas para, no final, não chegarem a lugar algum.
Leiam "O pequeno príncipe" e retirem dele os ensinamentos de que precisam para viverem melhor, pois um livro só alcança seu objetivo quando é capaz de mudar pensamentos e ações. Que este livro seja capaz de tocar o coração de cada um de vocês fazendo-os despertarem para as coisas mais essenciais. É o que vos desejo.
Mas, o menino insiste. Ele nunca desistira de algo que quisesse. O aviador, como que para se livrar do menino, uma vez que precisava urgentemente consertar seu avião, desenha o carneiro e, também, a pedido do menino, uma caixa para colocar o animalzinho dentro. São desenhos muito pequenos, porque o garoto já alertara que no seu planeta, pouco maior que uma casa, as coisas eram bastante pequeninas.
Assim, o aviador conhecera o Pequeno Príncipe e pôs-se, seis anos depois, a nos contar essa história.
O pequeno príncipe deixara seu pequeno planeta em busca de trabalho e para aprender coisas novas. No seu planeta, ele tinha por atividade limpar três vulcões, um deles inativo, bem como impedir que os baobás crescessem demasiadamente a ponto de ocupar todo o seu planeta, um dos motivos porque ele queria um carneiro que comesse os baobás.
Antes de chegar à Terra e conhecer o aviador, o pequeno Príncipe passara por alguns outros planetas e conheceu algumas figuras inusitadas.
O primeiro planeta era habitado por um rei. Ao ver o pequeno príncipe, o rei se animou com a ideia de ter um súdito aos seus pés, orgulhoso que era. O rei fez questão de afirmar ao pequeno todo o seu poder, já que reinava sobre todas as coisas. O que mais causava alegria ao pequeno era ver o pôr-do-sol, portanto pediu ao todo poderoso que usasse de seu poder para ordenar ao sol que se pusesse várias vezes num só dia. Infelizmente, o rei não pôde atender a esse pedido. Como não queria admitir que seu poder não era tão grande assim, informou ao menino que precisava esperar por condições mais favoráveis para atender o seu pedido.
Entretanto, o soberano ofereceu outras regalias ao pequeno. Poderia torná-lo Ministro da Justiça, embaixador ou qualquer outra autoridade. Mas, o pequeno só queria a chance de ver o sol se pôr várias vezes num só dia. Esse era o seu único desejo.
Ser Ministro da Justiça não o interessou. Julgar a quem? Não havia ninguém para julgar. Além do mais, ele não gostava de condenar ninguém à morte. Então, resolveu ir embora daquele lugar.
O Rei ponderou: "Você pode julgar a si mesmo." A resposta do pequeno foi categórica: "Posso julgar a mim mesmo em qualquer outro lugar." Depois, foi-se embora.
O segundo planeta era habitado por um vaidoso. Se alguém ainda não sabe, quero explicar. Vaidoso é aquele que tem vaidade. Vaidade provém do latim vanitas e quer dizer vazio. Somos vaidosos porque somos vazios. Dentro de nós sabemos o tamanho de nossa insignificância e, por isso, queremos provar o tempo todo que somos importantes. Eclesiastes, um dos livros bíblicos que mais gosto e que deu-me a dimensão da existência, nos chama a atenção para a nossa desimportância diante da magnitude de Deus:
"É para o benefício das pessoas que Deus as põe à prova, para que vejam que elas, em si mesmas, são como animais, pois a sorte do ser humano e dos animais é a mesma; tanto morre um como o outro; todos têm o mesmo sopro. O ser humano não leva vantagem nenhuma sobre os animais, porque tudo é ilusão. Todos vão para o mesmo lugar: Todos vêm do pó, e ao pó todos voltam."
Portanto, tudo é ilusão e vaidade.
Dito isso, saltemos para o encontro do pequeno príncipe com o nosso vaidoso, que gostava de muitos aplausos e elogios. "Os vaidosos só escutam os elogios."
Quis ser admirado pelo pequeno, que nem sabia o que era admirar. "Admirar significa reconhecer que eu sou o homem mais belo, o mais bem-vestido, o mais rico e o mais inteligente do planeta" - disse o vaidoso.
O pequeno príncipe achou tudo muito estranho e questionou: "Eu até posso admirá-lo. Mas o que você ganhará com isso?" E foi-se embora do segundo planeta.
O aplauso, o elogio, o reconhecimento ou o julgamento do outro não muda o que somos e também não altera quem somos. E por que sempre estamos buscando aceitação do outro? Porque somos vazios e iludidos. Porque nos vemos mais poderosos do que realmente somos e não pensamos que basta uma ventania, uma doença ou uma rejeição para nos derrubar. Grande é Deus. Ele e só Ele. O livro da Sabedoria, Eclesiástico, nos alerta a combater nosso complexo de Deus: "De que, porém, se orgulhará quem é terra e cinza, quem, ainda em vida, expele os intestinos: Uma doença prolongada zomba do médico; quem hoje é rei amanhã estará morto. Pois na morte são os répteis, as feras e os vermes que têm como herança o ser humano".
Quero que vocês, meus leitores, perdoem-me por estar sendo tão dura. O pequeno príncipe é um livro tão amado por muitos e eu me ponho a fazer considerações sobre finitude ou morte. Não me levem a mal. Para vivermos melhor, dando atenção ao que realmente importa na vida, precisamos o tempo todo estarmos conscientes da nossa mortalidade.
O exercício que faço contra a minha vaidade é diário e constante. E, ainda assim, muitas vezes suponho-me grande. Aí quando vou crescendo, crescendo e crescendo, leio Eclesiastes e Eclesiástico e, de novo, torno ao pó.
A existência do pequeno príncipe era simples e melancólica, desprovida de toda vaidade. Não sou eu que o digo para afirmar minha própria melancolia. O livro o diz. E, por isso, talvez eu ainda tenha que falar aqui de coisas simples e melancólicas. Perdoem-me mais uma vez. Apesar disso, o que quero é que vocês sejam alegres.
Já o terceiro planeta era habitado por um bêbado. Um bêbado que bebia para esquecer que bebia, pois sentia vergonha de beber. Pergunto-me: por que às vezes continuamos fazendo o que nos envergonha?
O quarto planeta era habitado por um empresário que mal percebera a presença do pequeno príncipe, uma vez que estava muito ocupado fazendo suas contas. O empresário se autointitulava como um homem preciso e sério, que não tinha tempo para lidar com bobagens, pois andava sempre muito ocupado. Tão ocupado com os seus negócios que até desenvolveu uma crise de reumatismo por não ter tempo de praticar atividade física. Só os números é que interessavam o empresário. Porque os adultos adoram números.
"Quando vocês falarem de um novo amigo, os adultos nunca vão perguntar sobre as coisas essenciais. Nunca irão perguntar, por exemplo: "Qual é o som da voz do seu amigo? Quais as brincadeiras que ele gosta mais? Ele coleciona borboletas?" Os adultos irão perguntar: "Qual a idade dele? Quantos irmãos ele tem? Quanto ele pesa? Quanto o pai dele ganha?" Só assim acreditam que podem conhecer uma pessoa. Se vocês disserem aos adultos: "Vi uma linda casa de tijolos cor-de-rosa, com gerânios nas janelas e pombos no telhado...", eles não conseguirão visualizar essa casa. Será preciso dizer: "Vi uma casa que custa dois milhões de reais." Aí, sim, eles vão exclamar: "Essa casa deve ser linda"!
Portanto, não permitam que suas ocupações diárias e a necessidade de acumular, a ganância, façam com que vocês percam a sensibilidade para o essencial. Esqueçam os números.
Ao perceber a forma estranha com que o empresário conduzia sua vida, o pequeno príncipe resolvera ir embora daquele planeta.
O quinto planeta, de tão pequeno que era, só cabia um lampião e um acendedor de lampião. O acendedor acendia e apagava o lampião minuto por minuto. Esse ofício chamou a atenção do pequeno príncipe, que logo quis saber o porquê do acender e apagar o objeto em períodos tão curtos de tempo. O acendedor de lampiões respondeu que era o que mandava o regulamento. Entretanto, o planeta começou a girar mais rápido e o regulamento não fora atualizado. Ainda assim, o acendedor era fiel à sua função de acender e apagar o lampião, conforme a regra.
O pequeno príncipe imaginou que o habitante do quinto planeta talvez fosse desprezado pelo rei, pelo vaidoso, pelo bêbado e pelo empresário, contudo reconheceu: "ele é o único adulto que não me parece ridículo, talvez porque se dedica a fazer uma coisa sem se preocupar apenas com os seus próprios interesses". "Este é o único adulto que poderia ser meu amigo."
O sexto planeta era ocupado por um geógrafo que se autointitulava muito importante (ele era muito vaidoso). O geógrafo ficava em seu planeta esperando que os exploradores chegassem com as informações sobre cidades, mares, montanhas, rios, desertos e oceanos para que ele fizesse suas anotações.
O pequeno príncipe pôs-se a falar sobre o que existia em seu próprio planeta. Ao informar ao geógrafo que em seu planeta existia uma flor, aquele não achou nada interessante essa informação para os livros de geografia. "As flores são efêmeras", disse ao pequeno. "Mas o que significa efêmera?" - indagou. O geógrafo respondeu que efêmera é uma coisa ameaçada de desaparecer em breve.
Ao lembrar da flor que deixara e de sua efemeridade, o pequeno príncipe teve a sua primeira reação de arrependimento. Descobriu ali a mortalidade do ser amado. Talvez não houvesse mais tempo de recuperá-la. Talvez, quando voltar para o seu pequeno planeta, a flor terá desaparecido, pensou ele. Isso o entristecera e ele foi embora do sexto planeta pensando em sua flor.
De novo, o tema da finitude nos lembrando de que não somente as flores são mortais como também o são todos aqueles que amamos.
O pequeno príncipe amava a flor, mas a achava extremamente vaidosa e orgulhosa e esse fato passou a incomodá-lo muito.
Por outro lado, era uma flor bela, envolvente e perfumada. Tinha defeitos e qualidades como qualquer ser.
Ainda assim, o pequeno príncipe resolveu abandoná-la, mesmo depois de a flor declarar o seu amor por ele e admitir o quanto fora vaidosamente tola.
"Fui incapaz de entendê-la! Eu não deveria ter julgado a flor por suas palavras, mas por suas ações. Ela me oferecia seu perfume e me enchia de alegria. Eu jamais deveria tê-la abandonado! O certo mesmo era eu ter percebido sua ternura por trás daqueles truques bobos. As flores são tão contraditórias. Mas eu era jovem demais para saber amá-la."
Precisamos entender e, sobretudo, aceitar que os que amamos, assim como nós mesmos, têm virtudes e defeitos. Essa é uma verdade imutável, ainda que não saibamos lidar com ela. Somos imperfeitos, mas podemos nos tornar melhores a cada dia sem que para isso abandonemos os que amamos. Não deixemos o arrependimento vir tarde como veio para o pequeno príncipe ao lembrar da possibilidade de ter perdido a sua flor. Aprendamos com a dor dele antes que tenhamos as nossas próprias dores por não aprendermos com os exemplos dos outros.
O sétimo planeta visitado pelo nosso pequeno príncipe foi a Terra.
"A Terra não é um planeta como outro qualquer. Existem nele cento e onze reis (não se devendo esquecer, é óbvio, os reis negros), sete mil geógrafos, novecentos mil empresários, sete milhões e meio de bêbados, trezentos e onze milhões de vaidosos, ou seja, um total de mais ou menos dois bilhões de adultos."
Ao chegar à Terra, o pequeno príncipe se deparou com um jardim cheio de rosas. Eram rosas muito parecidas com a flor que deixara. O pequeno ficou profundamente triste porque sua flor tinha lhe falado que era a única de sua espécie em todo o Universo. "E agora estavam na sua frente cinco mil flores muito parecidas com ela, num único jardim!"
Mais tarde, ao se deparar com uma raposa, as coisas começaram a ficar mais claras para o pequeno.
A raposa, muito astuta, explicou-lhe: "Você, para mim, ainda não passa de um menino semelhante a milhares de outros meninos. Eu não tenho necessidade de você. E você também não tem necessidade de mim. Eu, para você, ainda não passo de uma raposa semelhante a milhares de outras raposas. Mas se você me cativar, nós teremos necessidade um do outro. Você será o único menino do mundo para mim. E eu serei a única raposa do mundo..."
Assim, o pequeno príncipe entendeu que sua flor não era uma flor como as outras. Ela o havia cativado. É o tempo que doamos ou perdemos com algo ou alguém que torna esse algo ou alguém importante para nós.
Portanto, "somos sempre responsáveis por aquilo que cativamos". Somos nós os próprios responsáveis pelos laços que criamos.
O pequeno príncipe também achou o sétimo planeta muito estranho e fez algumas observações acerca dos habitantes da Terra:
"Os seres humanos não têm imaginação. Só repetem o que os outros dizem..."
"Ninguém está contente no lugar onde está."
"Só as crianças sabem o que procuram."
"Os seres humanos embarcam num trem expresso, mas depois já não sabem o que estão procurando. E por isso começam a se agitar e dão mil voltas sem saber para onde ir..."
Esse é um livro para ser lido e relido inúmeras vezes, em diversos momentos de nossa vida. Eu mesma já o li três vezes e cada vez aprendo algo novo. Não é à toa que se tornou um clássico da literatura. O seu autor, Antoine de Saint-Exupéry, era mesmo um aviador que teve seu avião abatido pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
Ao saber de quem se tratava, o soldado que alvejou o avião do escritor, declarou: "Eu só soube depois que era Saint-Exupéry. Eu queria que não tivesse sido ele, porque todos os jovens da minha geração leram seus livros. Nós adorávamos ele."
Talvez o pequeno príncipe tenha retornado ao seu planeta e encontrado sua flor. Não saberemos.
Não saberemos se a serpente que prometera levá-lo de volta ao seu planeta cumpriu a promessa ou se usou de artimanhas para destruí-lo.
Prefiro acreditar que ele teve um final feliz ao lado de sua flor e que aprendeu que não adianta andar por todos os planetas se não temos ao nosso lado os que amamos.
O essencial não é ver paisagens, não é transitar por todos os lados, não é conhecer pessoas "importantes", não é dar voltas e voltas ao mundo, pois "só se ver bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos".
Como nos ensina a Bíblia, em Mateus: "Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração."
Descubram, leitores, onde estão os vossos tesouros e não percam tempo de suas vidas dando voltas e mais voltas para, no final, não chegarem a lugar algum.
Leiam "O pequeno príncipe" e retirem dele os ensinamentos de que precisam para viverem melhor, pois um livro só alcança seu objetivo quando é capaz de mudar pensamentos e ações. Que este livro seja capaz de tocar o coração de cada um de vocês fazendo-os despertarem para as coisas mais essenciais. É o que vos desejo.
Quanta perfeição!!! Você continua sendo você, porém, em altos voos. Siga voando, deixando essas preciosidades, que Deus continue inspirando. Encantamento define.
ResponderExcluirVirna.
Que alegria o seu comentário provocou em mim! Obrigada, Virnoca. Bjs!
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